quem compra de quem cozinha imagina uma vida exclusivamente deliciosa entre cheiros, provas e descobertas. de fato é assim, mas não é exclusivo. um dos momentos que misturam de uma maneira surreal o lado bom e ruim é a ida ao supermercado. sou preguiçosa por natureza e por taurinice (pessoas de Touro, para os não fãs de astrologia), luto contra isso nas minhas tarefas todas (da cozinha ao pilates). li num livro de Costanza Pascolato, igualmente taurina, que ela também tem disso e fiquei aliviada, ela usa as mesmas armas que eu: pensa no depois e na qualidade de vida.
voltando ao assunto, para mim ir ao supermercado é um desses momentos de preguiça, faço tudo para ir o mínimo e raramente funciona porque na cozinha brota coisas a comprar. é lá, na hora da feira, que encontro todo tipo de gente, geralmente gente que me deixa com a certeza de porque o Brasil não vai para frente. abandonam carrinhos na fila e no caminho do caixa, não dizem as palavras mágicas (me pergunto como foi a infância deles), não cresceram de modo geral, estão com pressa assim como eu, mas não pensam nos outros. é incrível como neste local tudo isso fica evidente com mais força, talvez se os encontrasse num restaurante não perceberia nada disso. o detalhe que eles não sabem é que precisamos agir no modo educado sempre.
numa dessas idas nada felizes, foi um dia que eu nem imaginava precisar parar lá, uma senhora começa a papear na fila. eu, já cheia de pé atrás em relação aos humanos do supermercado, fiquei sem puxar muito papo. aos poucos, cedi. conversa vai e vem, resolvo comentar sobre Portugal num papo sobre sardinhas (era a capa de uma revista de saúde, foquei nisso), portanto nada mais natural. a mulher pirou. começou a elogiar o Brasil num festival de patriotismo sem fim. fiquei com cara de nada sem entender nada e sem falar nada. eu estava apenas elogiando os benefícios da pobre sardinha. ouvi um milhão de loucuras sobre nosso colonizador ter trazido tudo que não presta de lá para cá, e segundo ela significava que lá também não devia ser boa coisa, rolou uns xingamentos absurdos que não vou reproduzir aqui.
enfim, paguei a conta e fui embora pensando naquela cena maluca e tendo certeza que humanos não sabem viver no supermercado. no caminho, a pé como usual, encontrei uma criança com fome (ainda bem um dos humanos comprou uma sopa para ela, estava já me preparando para voltar a fila e comprar algo para dar ao menino), um cidadão numa moto sem cumprir as leis de trânsito subindo na calçada, outro jogando lixo pela janela do ônibus. talvez a gente não esteja sabendo viver no grande supermercado que o mundo se tornou.
Ps: este texto foi escrito no dia 05/06/14. Estava guardadinho aqui, mas achei conveniente ser o da volta deste blog, principalmente nestes tempos que precisamos nos repensar enquanto sociedade.